Direito fundamental à integridade psíquica e moral

George Salomão Leite[1]

A integridade psíquica é conhecida no ramo da psicanálise como estrutura do sujeito. Tal estrutura tem sua construção ao logo da existência humana, e possui características anímicas que predispõem a pessoa a relacionar-se afetivamente, profissionalmente, desenvolver talentos artísticos e lúcidos na convivência com seus semelhantes. Referido bem individual, à sua maneira, tem por objetivo buscar a efetivação de seus prazeres, ou seja, da felicidade. Assim, os valores morais, princípios éticos ou religiosos, a capacidade afetiva emocional, o autoconceito, a autoimagem, o respeito próprio ou sentimento de autoestima são componentes da integridade psíquica da pessoa e constituem um complexo de bens ideais que, somados, determinam o caráter e a personalidade do indivíduo, que o caracterizam como um ser humano único.[2]

O art. 5°, III, da Constituição Federal, proíbe a submissão de qualquer pessoa a tratamentos desumanos ou degradantes. Por sua vez, o Pacto de San José da Costa Rica[3], inserido em nosso ordenamento jurídico através do Decreto n° 678/92, conferiu expressamente proteção ao Direito à Integridade Moral[4].

A integridade moral se constitui em direito humano e fundamental voltado para proteger o ser humano no tocante à sua cosmovisão da vida, é dizer, da vida individual, o que cada um considera bom ou mal para si. É possível apontar algumas faculdades que emanam do direito à integridade moral: a) não ser sujeito de humilhações ou vexações[5]; b) não ser vítima de tratamentos degradantes ou desumanos; c) não sofrer agressões à sua honra e reputação; d) não ser vulnerado em sua intimidade; e) não ser obrigado a conduzir-se contra seus valores, convicções ou crenças e; f) não ser tratado como uma coisa ou instrumento a serviço de um fim. Esta última nota evidencia a própria noção de dignidade da pessoa humana, conforme apresentada por Kant[6] na Fundamentação da Metafísica dos Costumes, na medida em que o ser o humano se constitui num fim em si mesmo, sendo vedada qualquer tentativa de instrumentalização do indivíduo.

[1] Presidente da Escola Brasileira de Estudos Constitucionais – EBEC. Autor do “Curso de Direito Constitucional”. Rio de Janeiro: Editora GZ, 2021.

[2] Augusto F. M. Ferraz de Arruda, Dano moral puro ou psíquico. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, pg. 25.

[3] Convenção Americana sobre Direitos Humanos, de 22 de novembro de 1969.

[4] “Art. 5°. Direito à integridade pessoal.

  1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral.
  2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano.

(…)”

[5] Se enquadra, neste contexto, a Súmula Vinculante n° 11, do Supremo Tribunal Federal: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.”

[6] Segundo Kant, “todos los seres racionales están sujetos a la ley de que cada uno de ellos debe tratar-se a sí mismo y tratar todos los demás, nunca como simple médio, sino siempre al mismo tiempo como fin em sí mismo.

(…)

En el reino de los fines todo tiene o un precio o una dignidad. Aquello que tiene precio puede ser sustituido por algo equivalente; en cambio, lo que se halla por encima de todo precio y, por tanto, no admite nada equivalente, eso tiene una dignidad.” in Fundamentación de la Metafísica de las Costumbres. Mexico: Editorial Porrúa, 2007, pg. 53.

Minutos Constitucionais

Por George Salomão

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