Direito fundamental à integridade física
George Salomão Leite[1]
O direito à integridade física é aquele inerente a salvaguarda do corpo da pessoa, em oposição à sua esfera moral e psíquica. Assim, pois, o aspecto físico da integridade pessoal confere proteção ao corpo e à saúde, para que as pessoas possam se deslocar em liberdade, viabilizando a proteção ao corpo humano em seu aspecto anatômico, funcional e fisiológico. Por tal razão, abarca os seguintes objetos: não ser privado de algum sentido ou órgão corporal, não sofrer lesões, não ser fisicamente torturado, não ser objeto de castigos corporais e amputações, não ser submetido a tratamentos, intervenções ou experimentos médico-científicos, sem o devido consentimento e não ser vítima de violação sexual.
Em sede constitucional, o direito fundamental à integridade física encontra guarida no art. 5°, III, cujo enunciado prescritivo dispõe que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. Resta claro, pois, que o citado dispositivo se constitui numa densificação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Em 1989, um ano após a entrada em vigor da Constituição Federal, o Brasil promulgou a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, através do Decreto n° 98.386/89. Consoante o disposto no art. 2° do instrumento normativo ora citado, por tortura se deve entender “todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente a uma pessoa, penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim. Entender-se-á também como tortura a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou angústia psíquica.” Neste sentido, já decidiu o STF ser incompatível com o art. 5°, III, a conduta de policial militar que, “a pretexto de exercer atividade de repressão criminal em nome do Estado, inflige, mediante desempenho funcional abusivo, danos físicos a menor momentaneamente sujeito ao seu poder de coerção, valendo-se desse meio executivo para intimidá-lo e coagi-lo à confissão de determinado delito, pratica, inequivocamente, o crime de tortura.”[2]
Com o propósito de reforçar o que já estava previsto na Constituição e na Convenção Interamericana, o Congresso Nacional aprovou, em 1997, a Lei n° 9.455/97, cujo objeto dispõe sobre os crimes de tortura.
Por fim, cabe trazer à baila a definição de tortura desenvolvida pela Arquidiocese de São Paulo, constante no Projeto Tortura Nunca Mais: “(…) tortura é tudo aquilo que deliberadamente uma pessoa possa fazer a outra, produzindo dor, pânico, desgaste moral ou desequilíbrio psíquico, provocando lesão, contusão, funcionamento anormal do corpo ou das faculdades mentais, bem como prejuízo à moral.”[3]
[1] Presidente da Escola Brasileira de Estudos Constitucionais – EBEC. Autor do “Curso de Direito Constitucional”. Rio de Janeiro: Editora GZ, 2021.
[2] HC 70.389, rel. Min. Celso de Mello, j. 23.06.94.
[3] Projeto Tortura Nunca Mais, pg. 2, disponível em https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/nunca/07.pdf. Acessado em 03.10.20, às 13h32.
Minutos Constitucionais
Por George Salomão
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